Pobreza é violação grave dos direitos humanos
A Comissão Nacional Justiça e Paz entrega uma petição na Assembleia da República para que a pobreza seja reconhecida como uma violação grave dos Direitos Humanos. Este reconhecimento seria um passo de gigante para alterar as políticas económicas e sociais do país.
No Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, a Comissão Nacional Justiça e Paz entrega na Assembleia da República uma petição para que a pobreza seja reconhecida como uma violação grave dos Direitos Humanos.
Manuela Silva, presidente da Comissão, considera que este reconhecimento seria «um passo fundamental» para alterar as políticas económicas e sociais do país.
«A partir deste reconhecimento haveria naturalmente que desenvolver algumas medidas que lhe dessem consistência na nossa ordem jurídica e na nossa politica económica e social», defende Manuela Silva.
A petição, que conta com 20 mil assinaturas, avança ao poder político três sugestões com vista à erradicação da pobreza.
Uma dessas sugestões, explica Manuela Silva, passa por «definir um limiar oficial de pobreza que esteja sempre em relação com o nível de rendimento nacional e as condições de vida padrão na nossa sociedade, e que esse limiar seja uma referência obrigatória para a definição e aplicação das politicas publicas».
Os assinantes da petição solicitam, também, «que se crie um mecanismo parlamentar que observe e acompanhe as políticas públicas no sentido de conhecer o impacto que têm sobre a pobreza» e que os portugueses sejam informados, anualmente, «acerca da situação de pobreza que existe em Portugal e do progresso que possa vir a ser feito na sua erradicação».
Petição à Assembleia da República
Os signatários entendem que a pobreza constitui uma grave negação dos direitos humanos fundamentais e das condições necessárias ao exercício da cidadania, situação que reputam eticamente condenável, politicamente inaceitável e cientificamente injustificável.
Considerando que:
a pobreza e a exclusão têm causas estruturais e, por isso, não se resolvem apenas com sobras ou gestos de generosidade esporádica;
a pobreza é um problema que reclama apoio para ocorrer às carências, mas, cujas causas só podem ser removidas modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram e perpetuam a pobreza;
o mundo em que vivemos é um mundo de abundância e desperdício e que nunca, como hoje, foi tão possível erradicar a pobreza;
o nível de rendimento já alcançado no nosso País permitiria eliminar a pobreza que afecta cerca de um quinto da população residente em Portugal.
Os signatários solicitam à Assembleia da República que:
reconheça a pobreza como uma violação grave de direitos humanos;
estabeleça um limiar oficial de pobreza, em função do nível de rendimento nacional e das condições de vida padrão na nossa sociedade, que sirva de referência obrigatória à definição e à avaliação das políticas públicas de erradicação da pobreza bem como à fixação de prestações sociais;
crie um mecanismo parlamentar de observação e acompanhamento das políticas públicas, seus objectivos e instrumentos, no que respeita aos seus impactos sobre a pobreza, e que o mesmo esteja habilitado ao exercício de uma advocacia colectiva em favor dos pobres;
proceda, anualmente, a uma avaliação da situação da pobreza no nosso país e do progresso feito na sua erradicação.
Esta petição é iniciativa da Comissão Nacional Justiça e Paz.
Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza
Por POR CATARINA GOMES
A pobreza em Portugal estacionou. Embora os bairros de barracas tendam a
desaparecer da paisagem nacional, poucas alterações houve no perfil da
pobreza e o fenómeno está longe de ser erradicado: um em cada cinco
portugueses (cerca de 21 por cento da população) é pobre e os idosos
pensionistas continuam a ser o grosso do problema. Os imigrantes e as
minorias étnicas são novas categorias de pobres em forte expansão - o Dia
Internacional para a Erradicação da Pobreza, uma iniciativa das Nações
Unidas, é assinalado hoje.
"Se há matéria na qual Portugal apresenta um bloqueio importante em relação
aos seus parceiros europeus, é precisamente o da pobreza", defende Luís
Capucha, sociólogo do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da
Empresa (ISCTE), especialista na área da pobreza e exclusão social.
Com políticas como o Rendimento Mínimo Garantido, o crescimento do salário
mínimo acima dos níveis de inflação, o aumento das pensões mais baixas e o
Programa Nacional de Luta Contra a Pobreza, Portugal conheceu uma diminuição
da taxa de pobreza na segunda metade da década de 90: em 1995, 23 por cento
de portugueses tinham um rendimento inferior ao limiar de pobreza (cerca de
350 euros); desde 1998 até 2000 (o dado mais recente) estacionou nos 21 por
cento. Ainda assim, seis pontos acima da média europeia, indicam os dados do
Eurostat publicados este ano.
Mas o que se esconde detrás dos números? A visibilidade dos novos pobres
aumentou - com o grupo dos imigrantes e minorias étnicas -, mas é a pobreza
tradicional que continua a marcar a sociedade portuguesa. Cerca de 30 por
cento dos pobres portugueses são idosos pensionistas, cerca de sete por
cento são empregados de baixo rendimento, duas categorias de pessoas que
passam dificuldades pelo atraso estrutural que continua a caracterizar o
país, refere Luís Capucha. As pensões de reforma e o nível de salários
encontram-se abaixo do nível de pobreza, reforça Alfredo Bruto da Costa,
presidente do Conselho Económico e Social, mas os níveis de privação dos
mais pobres têm-se atenuado com as novas medidas sociais, defende.
Ao mesmo tempo, os processos de modernização trouxeram "um grupo de pobres
em forte expansão", comenta Luís Capucha: às minorias étnicas tradicionais
(ciganos e africanos lusófonos) juntam-se agora um novo grupo de minorias
étnicas, acrescenta Rogério Roque Amaro, investigador do ISCTE, autor de "A
luta contra a pobreza e a exclusão social em Portugal". Este fenómeno mais
recente povoa, sobretudo, espaços urbanos e suburbanos degradados e tem
tendência a criar novas tensões sociais, sublinha.
O processo de modernização trouxe também mudanças ao nível das estruturas
familiares: as famílias monoparentais femininas são outra categoria em
crescimento, têm pouca formação e dificuldades acrescidas para entrar no
mercado de trabalho. Em todos os indicadores de pobreza, as mulheres tendem
a ser mais vulneráveis do que os homens, refere Luís Capucha.
"Peças de xadrez"
Ao mesmo tempo, a forma como se pretende fazer face ao problema da pobreza
nem sempre é a mais indicada. Rogério Roque Amaro cita o mau exemplo dos
processos de realojamento em Portugal. "Continuam a fazer-se com base em
critérios técnicos e não sociais", o que ajuda a agravar os problemas das
zonas desfavorecidas, defende. Os erros do passado repetem-se: as zonas de
realojamento continuam a ser estigmatizadas por letras que denunciam a falta
de identidade dos locais ("N1, B2...") e, acima de tudo, ignora-se todo o
trabalho social feito nos locais de barracas e transferem-se as pessoas
apenas de acordo com a correspondência entre as tipologias de apartamentos
(T1, T2, T3) e as dimensões das famílias. Resultado: quebram-se todas as
redes de vizinhança e associativismo e desenraízam-se as pessoas. Não é,
portanto, de estranhar que algumas pessoas digam que se sentiam mais felizes
nos locais onde estavam, em barracas, do que nos novos blocos onde são
depositados, comenta Roque Amaro. A melhoria aparente das condições de
habitabilidade dá lugar à degradação dos ambientes sociais e ao aumento do
estigma destes espaços.
No realojamento de pessoas oriundas de bairros-problema pretende-se muitas
vezes apenas dispersar, "a salada russa sem critérios", sem dar ouvidos aos
técnicos no terreno, dá lugar, por exemplo, à transferência para o mesmo
local de grupos rivais, que nos seus locais tinham os seus territórios de
tráfico de droga, e ao aumento de violência. "Tratam-se as pessoas como
peças de xadrez".
"Estes processos são decisões de gabinete" envoltas em secretismo com receio
de aumentar as reivindicações das populações, reforça Roque Amaro. Persiste
o espírito de que se lhes está a ser feito um favor e não se insiste na
participação quando o protagonismo e participação das populações é
essencial, em obediência a recomendações de organismos internacionais, como
forma de dar direitos, mas também deveres e responsabilidades, conclui.
Leg: Os realojamentos de moradores oriundos de bairros problemáticos é feito
geralmente de acordo com critérios técnicos e não sociais
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Perguntas e Respostas
O que é a pobreza?
A pobreza foi durante muito tempo associada apenas à insuficiência de
rendimentos e consumos. Nesta perspectiva mais tradicional define-se uma
linha de pobreza em termos absolutos ou relativos segundo um determinado
nível de rendimento e/ou consumo, sendo pobres os que se encontram abaixo
dessa linha.
Mas o conceito de pobreza tem vindo a alargar-se centrando-se na
insuficiência de recursos também de natureza social, cultural, política e
ambiental. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, a pobreza é a incapacidade de "desenvolver uma vida longa,
saudável e criativa e de usufruir de um nível decente de vida, com
liberdade, dignidade, respeito por si próprio e respeito dos outros", uma
perspectiva mais recente que contempla a natureza social da pobreza, com a
consequente degradação das relações sociais aproximando-se do conceito de
exclusão social, lê-se nas definições de pobreza constantes de "A Luta
contra a pobreza e a exclusão social" (2003).
Que factores explicam a pobreza em Portugal?
Os factores são diversos mas alguns deles podem dividir-se em duas
dimensões: uma tradicional mais associada ao atraso estrutural do país que
se traduz nas pensões de reforma baixas, baixa escolaridade da população,
empregos de baixos salários; dentro dos factores de segunda ordem incluem-se
transformações nos quadros da família (por exemplo, as mulheres em situações
de monoparentalidade são uma das categorias sociais mais vulneráveis à
pobreza e à exclusão social) e factores demográficos com as novas vagas de
imigração, explica Luís Capucha, sociólogo do Instituto Superior de Ciências
do Trabalho e da Empresa.
Qual a dimensão da pobreza em Portugal?
Cerca de 21 por cento dos portugueses têm um rendimento inferior ao limiar
de pobreza (cerca de 350 euros), seis pontos mais do que a média europeia de
pobreza (15 por cento), indicam os dados mais recentes do Eurostat
(referentes a 2000) publicados este ano.
Quem são os mais pobres em Portugal?
A grande maioria dos pobres em Portugal continua a ser os idosos
pensionistas, empregados de baixos rendimentos, pequenos agricultores e
camponeses. Das novas categorias de pobres fazem parte os grupos étnicos e
culturais minoritários, as famílias monoparentais. Entre os grupos de maior
vulnerabilidade incluem-se também, em menor número, os desempregados de
longa duração, os sem-abrigo, os toxicodependentes e ex-toxicodependentes,
os detidos e ex-reclusos e as pessoas com deficiência.
A pobreza está a diminuir em Portugal?
Num Mundo Marcado
pela Pobreza...
Pobreza... o que será?
A pobreza está associada á insuficiência de rendimentos,
mas é muito mais do que isso...
é a incapacidade de muitas pessoas
“desenvolverem uma vida saudável, e usufruírem de um nível de vida
com dignidade, liberdade e respeito por si próprias e por todas as que as rodeiam.”
São pessoas frágeis como os idosos,
pequenos e simples agricultores/camponeses
os mais vitimados pela pobreza....
No entanto, em menor numero incluem-se também os: desempregados, sem- abrigo, ex-reclusos,
toxicodependentes e as pessoas com deficiência.
Assim, vou sendo como que obrigada a pensar,
que vivemos num mundo (num país, numa sociedade) que poderia dar mais de si...
Mundo este que deveria amparar, ajudar e acolher os mais desfavorecidos,
dando uma nova oportunidade para estas pessoas que sofrem,
se sentem desamparadas e frágeis ,
possam encontrar o verdadeiro caminho que lhes permita alcançar aquilo que tanto ambicionam...”uma vida mais saudável e feliz”.
É tão triste constatar que a realidade é a existência de crianças
que sonham com um futuro feliz e que têm idade para brincar,
são obrigadas a sofrer com a pobreza...
Crianças estas, sem um lar para as aconchegar e
proteger das agressividades do mundo ,
sem o alimento do dia-dia , não tendo muitas vezes
o que vestir e em alguns casos a inexistência de uma família capaz de as confortar, amar e respeitar como elas tanto merecem!
O sentimento que me invade neste momento é de profunda revolta,
só de pensar que existem pessoas que fazem
questão de afirmar não saber da existência de pobreza no nosso país,
algo que é muito conhecido e onde existem pessoas obrigadas a ser pobres.
Quando só é preciso descer uma rua,
percorrer os contentores do lixo, visitar bairros, passar por túneis do metro, que se viria a pobreza que já não se esconde...
Nos dias de hoje, é triste e vergonhoso,
constatar que não existe um esforço para combater a pobreza,
a fome, a exclusão social e outros males dos nossos dias.
Apontam-se os principais culpados perante esta situação,
principalmente pela sua inactividade nesse sentido.
E nós? Cada um de nós? Não seremos também culpados?
Não temos na sociedade o dever e a iniciativa de ajuda ,perante os mais desfavorecidos?
Se calhar somos cada um de nós ( a começar por mim)....
Não podemos baixar os braços
e “recusar” ajudar todas estas pessoas
possuidoras de um infinito e doloroso sofrimento que as vai acompanhando dia após dia,
elas mais do que ninguém necessitam do nosso apoio.
Catarina