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domingo, junho 10, 2007

Como construir uma máquina do tempo



Desafio não é fácil, mas também não é impossível

O GERADOR BURACO DE MINHOCA/REBOCADOR foi imaginado pelo artista futurista Peter Bollinger. Esta pintura descreve um gigantesco acelerador de partículas espacial capaz de criar, aumentar e mover o buraco de minhoca para ser usado como máquina do tempo


Viagens no tempo são um tema popular da ficção científica desde que H.G. Wells escreveu A Máquina do Tempo, em 1895. Mas esses deslocamentos são possíveis? Está dentro das possibilidades do homem a construção de uma máquina capaz de transportá-lo para o passado e o futuro?

Durante muitas décadas as viagens no tempo ficaram fora dos limites da ciência mais respeitável. Mas, nos últimos anos, o assunto começou a ser discutido com freqüência cada vez maior pelos físicos teóricos. Em parte, eles fazem isso para se distrair - é divertido pensar sobre viagens no tempo. Mas há um lado sério. Compreender a relação entre causa e efeito é parte das tentativas para a formulação de uma teoria unificada para a física. Se as viagens do tempo forem possíveis, mesmo em princípio, a natureza dessa teoria unificada será drasticamente afetada.

Começamos a entender melhor o tempo depois que Einstein formulou suas teorias da relatividade. Antes do aparecimento dessas teorias, considerava-se o tempo como absoluto e universal. Era igual para todos, mesmo se as circunstâncias físicas fossem diferentes. Na teoria da relatividade especial, Einstein propôs que o intervalo entre duas etapas depende da maneira como o observador se desloca. Isso é crucial.

Quando dois observadores se movem de maneiras diferentes, experimentam durações diferentes.

RESUMO
> Viajar no tempo para o futuro é fácil. Se viajar numa velocidade próxima à da luz ou permanecer num campo gravitacional muito intenso, o tempo vai passar mais devagar para que para as outras pessoas. Quando voltar à situação normal, estará no futuro.

> Viajar para o passado é mais complicado. Pela teoria da relatividade, isso é possível em certas configurações de espaço-tempo: um universo em rotação, um cilindro em rotação e num buraco de minhoca - um túnel que atravessa o espaço e o tempo.

Descreve-se este efeito frequentemente com o chamado "paradoxo dos gémeos". Vamos dizer que João e Maria sejam irmãos gémeos. Maria viaja numa nave em velocidades altíssimas até uma estrela e regressa à Terra. João continua em casa. Para Maria, a viagem durou um ano. Mas, quando ela retorna, descobre que se passaram dez anos na Terra. O seu irmão está nove anos mais velho que ela. João e Maria não têm mais a mesma idade, apesar de nascidos no mesmo dia. Este exemplo, de certa maneira, mostra uma viagem no tempo, mesmo limitada. Maria deu um salto de nove anos no futuro da Terra.

JET LAG
Este efeito, conhecido como dilatação do tempo, ocorre sempre que dois observadores se movimentam um em relação ao outro. No dia-a-dia não observamos grandes variações, porque o efeito só é perceptível quando o movimento ocorre em velocidades próximas à da luz. Nas velocidades dos aviões comerciais, a dilatação do tempo, numa viagem normal, corresponde a alguns poucos nanossegundos, o que não é suficiente para inspirar romances de ficção científica. De qualquer maneira, os relógios atômicos têm precisão suficiente para registrar a mudança e confirmam que o movimento realmente afeta o tempo. Assim, a viagem ao futuro é um fato comprovado, embora ainda não em grandes proporções.


Para observar saltos no tempo verdadeiramente impressionantes, é preciso olhar além do domínio da experiência normal. Partículas atômicas podem ser empurradas para velocidades próximas à da luz nos grandes aceleradores. Algumas dessas partículas, como os múons, têm relógios internos e decaem com uma meia-vida bem definida. É possível observar múons em velocidades altíssimas nos aceleradores decaindo em câmera lenta, o que confirma mais uma vez a

teoria de Einstein. Da mesma maneira, raios cósmicos também apresentam saltos espetaculares no tempo. Essas partículas se movem em velocidades tão próximas da luz que, para o ponto de vista de seus relógios internos, atravessam a galáxia em alguns segundos, embora para a referência da Terra pareça levar milhares de anos. Se não houvesse dilação do tempo, essas partículas nunca chegariam aqui.


A velocidade é uma maneira de saltar no tempo. Mas existe outra: a gravidade. Na teoria da relatividade geral, Einstein sugeriu que a gravidade faz com que o tempo escoe mais devagar. Os relógios andam um pouco mais depressa no sótão que no porão, que está mais próximo do centro da Terra e, portanto, mais no interior do seu campo gravitacional. De acordo com o mesmo princípio, os relógios andam mais depressa no espaço que no solo. O efeito é mínimo, mas já foi confirmado com o uso de relógios de altíssima precisão. Aliás, ele é levado em conta no Sistema de Posicionamento Global (GPS). Se não fosse, o fenômeno levaria motoristas, marinheiros e mísseis teleguiados a cometer erros de quilômetros no caminho para seus destinos.

Na superfície de uma estrela de nêutrons a gravidade é tão intensa que o tempo corre cerca de 30% mais lentamente, em relação à Terra. Visto dessa estrela, um fato pareceria acontecer com a velocidade fast-forward de um aparelho de vídeo. O buraco negro apresenta o máximo em termos de distorção do tempo. Na superfície do buraco, o tempo parece estar parado em relação à Terra. Isso significa que se você cair num buraco negro, de uma distância pequena, toda a eternidade passará diante de seus olhos no curto espaço que atravessará para atingir a superfície. A região no interior do buraco negro está além do extremo do tempo, no que diz respeito ao universo de fora. Se um astronauta conseguisse chegar bem perto de um buraco negro e voltar inteiro - uma possibilidade muito difícil, para não dizer suicida - daria um salto muito além no futuro.

SOLUÇÃO DE GÖDEL
Até agora venho discutindo a viagem no tempo para a frente, para o futuro. E para trás, para o passado? Isso é muito mais problemático. Em 1948, Kurt Gödel, do Instituto de Estudos Avançados de Princeton, apresentou uma solução para as equações dos campos gravitacionais de Einstein que descrevia um universo em rotação. Num universo desse tipo, um astronauta poderia chegar ao seu passado atravessando o espaço. Isso ocorreria devido à maneira como a gravidade afeta a luz. A rotação do universo puxaria a luz (e assim as relações causais entre os objetos) consigo, em seu movimento. Um objeto material viajaria no espaço num círculo fechado, que seria também um círculo fechado no tempo. A solução de Gödel foi considerada apenas uma curiosidade matemática, pois, em nenhum momento, as observações levaram à conclusão de que o universo gira em torno de si. Mas seu resultado serviu para mostrar que voltar atrás no tempo não é algo proibido pela teoria da relatividade.

VIAGEM PELO BURACO DE MINHOCA Uma Máquina do Tempo de Buraco de Minhoca em Três Etapas, Nenhuma das Quais Muito Fácil


1 - Encontre ou monte um buraco de minhoca, um túnel que liga dois pontos no espaço. Pode ser que buracos de minhoca de grande porte existam no espaço profundo, herança do Big-Bang. Se não encontrar nenhum, vamos ter que nos contentar com buracos de minhoca subatômicos, ou naturais (de acordo com algumas teorias, eles aparecem e desaparecem rapidamente em nosso redor) ou artificiais (produzidos por aceleradores de partículas). Esses buracos de minhoca pequeninos teriam de ser aumentados até atingir proporções úteis, talvez pelo uso de campos de energia como o que fez o espaço inflar logo depois do Big-Bang.
2 - Estabilize o buraco de minhoca. Uma infusão de energia negativa, produzida por meios quânticos como o chamado efeito Casimir, permitiria a passagem segura de um sinal ou um objeto através do buraco de minhoca. A energia negativa controla a tendência do buraco de minhoca de chegar a um ponto de densidade infinita ou quase infinita. Em resumo, impede que o buraco de minhoca se transforme em buraco negro.
3 - Transporte o buraco de minhoca. Uma espaçonave, com tecnologia muito avançada, separaria as aberturas

do buraco de minhoca. Uma abertura seria colocada junto à superfície de uma estrela de nêutrons, uma estrela de altíssima densidade, com campo gravitacional muito forte. A gravidade intensa faz com que o tempo corra mais devagar. Como o tempo corre mais depressa na outra abertura, os dois extremos do buraco de minhoca ficam separados não só no espaço, mas também no tempo.

Há outros cenários capazes de visualizar situações que permitiriam viagens ao passado. Em 1974, por exemplo, Frank Tipler, da Universidade Tulane, calculou que um cilindro maciço, infinitamente comprido, girando em torno do seu eixo em velocidades próximas à da luz, permitiria visões do passado, mais uma vez porque a luz seria puxada em torno do cilindro, formando um círculo. Em 1991, Richard Gott, da Universidade Princeton, sugeriu que as cordas cósmicas - estruturas que de acordo com os cosmólogos foram criadas nos estágios iniciais do Big-Bang - poderiam produzir efeitos semelhantes. O cenário mais próximo da realidade para a existência de uma máquina no tempo surgiu, porém, em meados da década de 80, com base no conceito do buraco de minhoca.

Os buracos de minhoca são comuns nos livros de ficção científica, onde aparecem também com o nome de portões espaciais. Trata-se de atalhos entre dois pontos separados no espaço. Se você entrar em um buraco de minhoca, sairá rapidamente no outro lado da galáxia. Os buracos de minhoca estão de acordo com a teoria da relatividade geral, uma vez que a gravidade não distorce só o tempo, mas também o espaço. A teoria permite a existência de análogos a túneis ligando dois pontos no espaço. Os matemáticos chamam esses tipos de espaço de multiplamente conectados. Como um túnel numa montanha pode ser mais curto que a estrada na superfície, um buraco de minhoca pode ser mais curto que um percurso pelo espaço normal.

TRANSFORMANDO O PASSADO A Mãe de Todos os Paradoxos

O paradoxo da mãe, formulado às vezes usando outras relações familiares, surge quando uma pessoa ou objeto pode voltar atrás no tempo e alterar o passado. Uma versão mais simples é apresentada com bolas de bilhar. Uma bola de bilhar passa através de uma máquina do tempo de buraco de minhoca. Ao sair da abertura, atinge ela mesma, como era no passado, impedindo, assim, sua entrada no buraco de minhoca. A solução do paradoxo vem de um fato simples: a bola de bilhar não pode fazer nada que não esteja de acordo com a lógica ou com as leis da física. Não pode passar pelo buraco de minhoca de uma maneira capaz de impedir a própria passagem pelo buraco de minhoca. Nada impede, porém, que passe pelo buraco de minhoca numa infinidade de outras maneiras.
O buraco de minhoca foi usado como recurso de ficção por Carl Sagan em seu romance Contato, publicado em 1985. Incentivados por Sagan, Kip Thorne e seus colegas do Instituto de Tecnologia da Califórnia se dedicaram ao trabalho de verificar se os buracos de minhoca seriam possíveis pelas leis da física. Partiram da idéia de que o buraco de minhoca lembraria o buraco negro, por ser um objeto com imensa gravidade. Mas, ao contrário do buraco negro, que oferece apenas uma viagem só de ida para o nada, o buraco de minhoca teria saída, além de entrada.
PAUL DAVIES

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