
Uma reportagem publicada na revista alemã Der Spiegel, sobre o Blue Brain, um mega projecto ambicioso de reproduzir o cérebro e suas funções através de computadores super potentes. O projecto é desenvolvido na Suíça. O link abaixo do site do projecto, na Universidade de Lausanne.
http://bluebrain.epfl.ch/
Por Manfred Dworschak
Uma rede de nervos artificiais está crescendo em um super computador na Suíça - que deverá simular um cérebro natural, célula por célula. Os pesquisadores que trabalham no "Blue Brain" [Cérebro Azul] prometem novas percepções sobre as origens da consciência humana.
A máquina é linda quando acorda - as células nervosas reluzem na tela em tons pastel, correntes eléctricas brilham através de um labirinto de sinapses. Logo depois de ligado, o cérebro parece um pouco sonolento, mas suaves surtos de corrente o despertam totalmente.
Essa peça de hardware inédita consiste em cerca de 10 mil chips de computador que actuam como células nervosas reais. Para simular um cérebro natural, parte do córtex cerebral de ratos jovens foi minuciosamente replicado no computador, célula por célula, juntamente com a estrutura das sinapses, em forma de árvore.
A simulação foi criada na Universidade Técnica de Lausanne, Suíça, onde 35 pesquisadores participam da manutenção desse cérebro artificial. Ele funciona em um dos super computadores mais poderosos do mundo, mas em breve até este ficará pequeno demais. O objectivo é construir uma máquina electrónica pensante muito maior, que em última instância replicaria o cérebro humano.
Um projecto tão ambicioso teria sido ridicularizado alguns anos atrás. "Hoje temos os computadores de que precisamos", diz o biólogo Henry Markram, 44, director do projecto. "E sabemos o suficiente para começar."
Markram sabe dos problemas que seu grupo deverá enfrentar. "Mas se não construirmos o cérebro nunca saberemos como ele funciona", diz. Na verdade, houve avanços formidáveis na pesquisa cerebral nos últimos anos, mas as respostas para as grandes perguntas são tão vagas quanto sempre foram. Como se desenvolve a consciência na orquestra eléctrica das células? Como exactamente um lampejo de inteligência se acende da interacção entre os genes, proteínas e substâncias mensageiras?
O modelo de Lausanne é a tentativa mais radical já feita de investigar o mistério da consciência. A ideia é sedutoramente simples: determinar como a mente surge da biologia e replicar a biologia. É uma tarefa que exige enorme paciência e atenção aos detalhes, um processo que significa copiar a natureza uma molécula de cada vez.
Embora o primeiro cérebro artificial possa parecer simples, será um modelo útil. Os pesquisadores poderão usá-lo para reproduzir as funções do órgão real e testar suas teorias. Conforme eles acrescentam novos processos, o modelo torna-se cada vez mais detalhado - uma espécie de projecto "wiki" da mente. Ele também apresenta uma vantagem importante em relação ao cérebro natural, pois permite que os pesquisadores monitorizar cada uma das actividades mentais simuladas na máquina.
Mas houve actividade mental?
O Blue Brain recém-nascido surpreendeu os cientistas por sua disposição desde o primeiro dia. Mal lhe haviam fornecido impulsos eléctricos quando estranhos padrões começaram a surgir na tela, com os clarões semelhantes a relâmpagos produzidos pelas células que os cientistas identificam com os processos de pensamento reais. Grupos de neurónios começaram a sintonizar-se até que começaram a disparar ritmadamente. "Isso aconteceu totalmente por conta própria", diz Markram. "Espontaneamente."
Construindo o cérebro electrónico
Dez mil células nervosas artificiais foram entrelaçadas em Lausanne, e os pesquisadores pretendem aumentar o número para um milhão até o fim do próximo ano. Isso não significa que eles estejam satisfeitos: o trabalho está previsto para durar até 2015 ou mais. Então, a menos que o projecto seja considerado demasiado ambicioso, Markram e sua equipe pretendem estar prontos para seu objectivo principal: um modelo de computador do cérebro humano completo - o que neste momento é quase uma fantasia, diante das cem bilhões de células que eles teriam de fabricar.
Os cépticos se perguntam qual o objectivo de replicar coisas com tanta dificuldade, se os cientistas têm tão pouca compreensão de seu objectivo e função. De fato, num futuro previsível ninguém saberá o que acontece exactamente nos circuitos do cérebro replicado, a não ser que parece sedutoramente autêntico para um observador externo.
Talvez os únicos que poderiam saber são os ratos que continuam existindo como sombras nesse super computador. Os pesquisadores abriram milhares de crânios de ratos ao longo dos anos, retiraram seus cérebros e os cortaram em finas fatias que mantiveram vivas. Então dirigiram pequenos sensores para cada neurónio. Eles escutaram as células disparando neurónios e interceptaram as respostas que vinham das células adjacentes.
As fatias de cérebro foram expostas a variados impulsos eléctricos. Os impulsos reflectiam os estímulos que podem ter sido recebidos pelos cérebros dos ratos de laboratório quando os animais cheiravam queijo ou eram assustados por uma forma. As células reagiam - assim como faziam quando os ratos estavam vivos - enviando correntes eléctricas pelo neuro plexo. Os equipamentos de medição dos pesquisadores registaram todos os sinais até que as fatias de cérebro expiraram.
No final, os pesquisadores do laboratório de Markram acondicionaram todo o repertório de comportamento de centenas de tipos de células em todas as situações concebíveis na vida de um rato - e o armazenaram em tabelas intermináveis. Essa enorme pilha de dados permitiu que os cientistas começassem a construir seu substituto digital.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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